então, caros amigos que frequentam (?) meu blog. é com muito esforço que 3 meses depois eu finalmente resolvo cuspir tudo o que me aconteceu em 11 de Janeiro de 2011 e que ainda me atormenta.
minha última viagem a Nova Friburgo foi marcada por estranheza. fui pra lá dia 28 de dezembro.
como disse, tudo de estranho aconteceu nessa viagem. primeiros dias eu e meu namorado trocávamos o chuveiro e um alicate enorme caiu no meu pé, com direito a inchar na hora de uma forma que eu nunca tinha visto, hospital, primeira vez que deito em uma maca de hospital e recebo medicação na veia.
primeira vez que passei o ano novo longe de casa, estava com o coração apertado, fui descobrir o porque um pouco depois, foi o último ano novo que meu avô passou com a minha família.
estava em friburgo e parecia que assistia um filme, ao invés de realmente estar lá, como sempre estive. um lugar que com o tempo soube transformar em refúgio, indo em qualquer época, qualquer final de semana possível e me sentindo em casa.
passou a meia noite e o celular tocou. o cachorro da mãe de meu namorado se jogou da cobertura com medo dos fogos. o ano novo foi marcado por lágrimas e interrogações. como isso foi acontecer? é tão louco. tão louco.
dia 8 de janeiro, ligamos pra Gustavo, ele vai até nossa casa, apresento umas músicas, escrevo num papelzinho pra ele procurar depois na internet com o Iuri reafirmando para que ele não esqueça. combinamos algumas coisas, pra quando estivéssemos no rio, sentamos os três na cozinha, tomamos umas geladas, conversamos mais, vamos até a rua Portugal, jogamos mais papo fora. "sério, vocês não conhecem minha casa ainda, vão lá, cara, dessa vez vocês tem que ir" "claro!". esse menino é mesmo um espírito de luz. vamos pra casa.
os dias foram passando e uma chuva incessante pairava sobre friburgo. desde o dia que chegamos até o dia que meus pais foram nos visitar, dia 9 de janeiro. até a visita deles por lá foi estranha, não que tenha acontecido nada, mas ainda não consegui entender o porque, eles deveriam mesmo ter ido lá.
uma neura se instala em minha mente. começo a achar desesperadamente e sem motivos que o prédio em que ficamos ia desabar. dia 10 para o dia 11. meus pais ainda estavam lá, e um temporal cai, raios, trovões, falta luz. desespero. não durmo. acho toda hora que estou ouvindo barulho de parede rachando, acho que tudo vai cair, acho que vamos desabar. a toda hora me levanto e vou na janela, não vejo nada. o prédio está no lugar. sinto uma aura pesada em friburgo, um lugar que sempre me foi acolhedor e eu sentindo um desconforto absurdo por lá.
dia 11, meus pais vão embora. fico com o coração mais apertado. meu namorado pergunta a toda hora se estou bem, meus pais perguntam se me sinto bem, se havia acontecido alguma coisa durante a viagem pois não estava com uma cara tranquila. não é nada. só acho que o prédio vai desabar a qualquer momento. é só isso.
"vamos na casa do Gustavo hoje?" "ah... hoje não, tô com preguiça, vamos ficar por aqui, amanhã a gente combina de ir no véu da noiva ou a Lumiar com ele, e depois vamos lá, sei lá. mas hoje não."
Iuri então liga pra Gustavo e combina de dia seguinte fazermos alguma coisa e "qualquer coisa aparece aqui mais tarde".
chega a noite, dia 11 comemoramos aniversário de namoro, vamos ao rodízio de pizza caseira. lugar lindinho. 9 horas da noite, começa a chover um temporal de balde. vamos esperar passar. "podem ficar aqui, assiste a novela aí, e espera essa chuva passar, fiquem a vontade". a chuva não passa. "tem uns sacos plásticos pra gente por na cabeça, moça?" "claro, claro... aqui" "obrigada." CORRE!
muita chuva e decidimos fazer um caminho diferente, passamos pela rua atrás da casa... ahh... aquela rua maravilhosa, de casarões lindos, com jardins, "vamos ter uma casa aqui no futuro, né?"
chegamos em casa. meu coração estava tão apertado que parecia que ia entrar dentro dele mesmo. desconforto, desconforto, desconforto. o prédio vai desabar, cair, cair, desabar, ele vai. estou com medo. vamos dormir. falta luz. não durmo.
raios e trovões, muitos! mais do que qualquer um já viu. não havia um espaço de tempo entre um raio e outro. a casa era iluminada raios. sinto tudo vibrar tamanha a intensidade do barulho. foi a tempestade mais aterrorizante que já vi. peço a santa bárbara, considerada protetora das tempestades, raios e trovões. peço para que acabe, peço proteção. acho que tudo vai desabar.
4 horas da manhã.
"tá ouvindo isso? TÁ OUVINDO ISSO???" "caralho, que barulho é esse?" vamos até a janela, o breu toma conta, os raios iluminam a encosta atrás da casa, um barulho de milhões de galhos se quebrando, somado ao som de uma onda ligada num amplificador. terra treme e eu junto. "TÁ DESABANDO! A ENCOSTA TÁ CAINDO, TÁ CONSEGUINDO VER???" "Tá ouvindo? As pessoas estão gritando!" "Não dá pra ver nada" "Ai meu Deus"
Começamos a ouvir outro barulho agora, um rio passando. "Acho que a rua virou um rio" "Vamos descer?" A rua virou um rio, as pessoas nas varandas com lanternas tentando ver o que estava acontecendo.
Sem saída. A rua um rio intrespassável, a parte detrás do prédio, de cara a uma imensa encosta que já havia caído metade. medo.
amanhece. ainda não podemos sair, o rio ainda corre na frente do prédio. janela dos fundos. metade da encosta, no lado direito, atrás do prédio havia caído. haviam casas ali. a encosta na direção do prédio estava inerte, pro lado esquerdo também. e com certeza chegaria perto se ela resolvesse cair. uma enorme encosta verde. era lindo de se olhar. vegetação densa, maravilhosa.
aconteceu.
lá de cima da montanha uns primeiros galhos começaram a se quebrar e veio a avalanche, a parte esquerda da encosta também caiu. mais pessoas gritando, pedidos de socorro. pude ver que o que eu sentia de madrugada ao ouvir os deslizamentos, a sensação de terra tremendo, era real. tudo tremeu nesse momento. o poste parecia de borracha. e o silêncio.
a encosta na direção do nosso prédio ainda estava inerte.
as casas que tanto desejávamos, admirávamos. as belas casas que falamos querer ter no futuro. elas não existem mais. a rua que passamos na noite anterior voltando da pizzaria. parte dela não existe mais. 30 pessoas que moravam naquela rua também não existem mais.
o rio da nossa rua baixou e pudemos sair. descobrimos que era de fato. com os deslizamentos, o rio que corria subindo a rua desviou e foi parar lá. fomos ver a dimensão do estrago. pessoas correndo para todos os lados, bombeiros, resgate, pessoas filmando.
fomos andar pela cidade e era espantoso. não havia acontecido só ali mas sim na cidade inteira. não havia luz, não havia sinal de celular. havia lama. entulhos. pessoas apáticas andando nas ruas. todos, sem saber o que havia acontecido. Nova Friburgo, a cidade confortável e maravilhosa em suas belezas.
Telefones residenciais voltam a funcionar. Passamos o dia inteiro ligando pro Gustavo, mas afinal o que poderia acontecer? Estaria tudo bem com ele. Passamos a noite seguinte na casa da mãe de nossa vizinha, até conseguir um ônibus de volta pra casa dia 13 de janeiro. deixamos todas nossas roupas e trouxemos apenas o essencial.
eu deixei parte do meu coração soterrado em Friburgo.
a volta foi difícil, deixar tudo do jeito como ficou, bagunçado. uma sensação de dupla vontade. ficar ou preciso voltar.
viagem de volta. vou aos poucos ficando aliviada por conseguir voltar pra casa. mas ainda estamos preocupados. fazemos uma ligação para saber de Gustavo e descobrimos que nosso amigo estava desaparecido, que a casa dele havia sido atingida. as lágrimas surgem automaticamente e o silêncio da viagem é cortado por duas pessoas soluçando no ônibus.
EU DEIXEI PARTE DO MEU CORAÇÃO SOTERRADO EM FRIBURGO.
E essa história não tem final, nunca vai ter.
Tem recomeço.
Faltam peças, nunca vão deixar de faltar.
Mas tem recomeço.
Afinal, meu sentimento sem motivos de que o prédio iria desabar não se concretizou.
Não no prédio.
Agora eu entendo.
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