domingo, 1 de março de 2009

Quadro

Pelo quadro na parede do meu quarto estou olhando o mundo
É um quadro e uma moldura. Apoio-me na moldura desse quadro e vejo a vida lá fora. Pessoas passando na rua, crianças correm, mulheres cantam cantigas de amor, homens riem sentado na calçada em frente ao bar, alguns pássaros cantam, céu azul, dia digno de um final feliz.
Um trovador na calçada recita umas palavras, moedas caem a sua frente, e todas essas imagens falsas rodam a minha frente. Tudo roda a minha frente, sinto uma náusea me subindo do estômago. Vou vomitar.
Volto para dentro de meu quarto e tranco meu quadro, nada acontece, sento-me na cama. Não posso ver toda essa gente na sua, alegre, a passear, não faço parte de qualquer coisa assim. Fecho as cortinas do meu quadro. Acendo a luz pois tenho medo do escuro, apesar de ainda estar claro, mesmo com as cortinas fechadas – seu pano é fino e transparente. Alguém está se aproximando do meu quarto, da minha porta.
Mão na maçaneta.
Gira.
Abre.
São meus personagens que entram pela porta de meu quarto brincando, cantando e rindo, como se ali o parque da cidade estivesse. Ouço música e tudo começa a rodar novamente, o som parece estar cada vez mais alto e cada vez mais pressionando minha cabeça, como se saísse de dentro dela, querendo expandir-se para o mundo inteiro ouvir, a qualquer momento ela pode explodir. Crescente, crescente, crescente, crescente. Como uma semente em seu rebento, criando raízes, se entranhando em mim. Estou sufocando, cada vez mais pessoas entram no meu quarto. Começo a gritar, mas ninguém ouve, estão todos falantes demais para ouvir. E no ápice da música, das vozes, das gargalhadas ensurdecedoras, silêncio. Dos menos esperados, silêncio. Eu ainda gritava, mas não saía som de minha boca. Parei, olhei ao redor, era apenas meu quarto, meus móveis... e uma janela fechada.

Um comentário:

Vicky disse...

''eu vejo tudo enquadrado, remoto o controle".